“O urgente geralmente atenta contra o necessário” é umha cita atribuída a Mao Tsé-Tung. Também, num dos quadrinhos de Quino, podemos ler Mafalda dizendo “Como sempre: o urgente nom deixa tempo para o importante”. A diferentes planos, esta pode ser umha máxima que articule as decisons vitais dum indivíduo ou toda a estratégia política dum movimento.
O caminho socialista deve ser umha travessia até o necessário, o comunismo, atendendo, no entanto, as urgências (mas só aquelas importantes: as que afectam ou afectarám grupos sociais denostados ou despossuídos, embora nom nos aproximem imediatamente ao nosso objectivo final; e aquelas que, ainda que socialmente nom sejam percebidas assim, cimentem um chanço mais nesse caminho cujo fim merecemos). Este foco nom é partilhado por todas as comunistas: há quem se relaciona com as estruturas do sistema como um meio para avançar na acumulaçom de forças que possibilite umha virtual mudança radical e quem desbota esta actuaçom por nom servir as ferramentas do amo para desmontar a casa do amo. O despreço pola escolha alheia é conhecido: podes ser reformista ou esquerdista; estar assimilada polo réxime ou ser irrelevante politicamente; ter desviaçons pós-modernas ou ser um simples economicista.
Umha concreçom desta “cruzada”, protagonizada por sectores que estám genuinamente preocupados polo momento de fraqueza do movimento operário no nosso contexto e outros colectivos objectivamente empobrecidos e denostados, é a ideia, com certeza mais espalhada em foros virtuais do que na vida diária das organizaçons, de que atender certas questons que nom tenhem umha relaçom directa com a luita económica é desviar-nos induvitavelmente do caminho até um horizonte sem desigualdades. E estes camaradas nom serám igual de taxativos noutros casos em que priorizemos (também, porque nom é excluinte) as luitas concretas que efectivamente tiram tempo e energias a outras actividades que podem ver como mais importantes, porque nom necessariamente terám a apertura dum CIM numha vila qualquer da Galiza como algo contrário à nossa luita troncal (ou, polo menos, nom como incompatível) mas sim o farám com, por exemplo, o debate arredor da chamada Lei Trans. Cada quem situa, nesse táboa em que um eixo vai da urgência à importáncia e o outro em funçom da prioridade, as suas teimas, mas é irresponsável que as comunistas aproveitemos esta lógica organizaçom temporal para permear as nossas fobias e incompreensons, mais fruto da ignoráncia e do nom querer entender o mundo na sua complexidade que da razom.
As urgências tomam forma segundo o lugar, o tempo e a ligaçom com o fundo, e é por isso que nom podemos ser apenas comunistas, por muito que isso signifique participar em circuitos reformistas, locais ou que nom impliquem contribuir directamente com o derrocamento do capitalismo a nível global. No nosso contexto, a protecçom dos direitos linguísticos (que pode ser visto como um capricho nacionalista para outras), dos direitos laborais das trabalhadoras que acodem à CIG (que pode ser criticada polo seu papel por definiçom reformista, como qualquer outro movimento que surja para paliar os efeitos do capital sobre os colectivos e as pessoas) ou a oposiçom à instalaçom do enésimo parque eólico no nosso território (quando o que queremos é umha economia planificada para os poderes privados nom depredar o meio) é à vez umha urgência e umha necessidade. Se combinamos a defesa de questons concretas, participando ademais daqueles espaços mais permeáveis a entender que a proposta que apresentamos as comunistas é a melhor para garantir a sobrevivência e bem-estar das pessoas e das cousas de que se importam, com a luita estratégica pola extinçom da ordem actual das cousas, nom estaremos fazendo nengumha renúncia. É obvio que o comunismo necessita da massificaçom, da popularizaçom, atraindo polo seu potencial e a sua proposta (e nom pola sua estética ou polas suas consignas vazias), mas erramos se pensamos que o que nos distancia desse vigor ou desse porvir que anelamos é a nossa participaçom em espaços através dos quais se negociam determinadas melhoras, a nossa implicaçom com questons que efectivamente significam gestionar o mesmo sistema que detestamos ou envolver-nos com debates que nom fôrom contemplados polos teóricos fundadores do nosso movimento político há mais de 150 anos.
As comunistas devemos estar ali onde existem pessoas com preocupaçons sociais e políticas para estimulá-las a ultrapassar a superficialidade que caracteriza a política institucional, para fazer saber que detrás da escolha de um ou outro governante existem questons mais importantes sobre as que intervir. E devemos ser exigentes connosco e com o nosso movimento, procurar termos também programa para os assuntos de urgência, desterrar comportamentos que impedem que parte da diversidade da classe operária se envolva na militáncia revolucionária. Compreender bem o mundo que temos para chegar melhor ao que queremos ter, evitar a fossilizaçom ideológica e pragmática, sermos responsáveis com os temas em que a moitxs nos vai a vida.
O risco de sermos socialistas num mundo capitalista, condenadas a enredar com as misérias inerentes a este sistema socioeconómico, é enfrentar a elevada frustraçom de nom avançarmos numha mudança de paradigma. Mas isto nom nos pode servir para impugnar as luitas que procuram melhoras imediatas para boa parte da povoaçom nem para desistir de trabalhar porque estas tenham umha repercusom directa numha luita mais ampla, que é a de construçom dum novo mundo sem hierarquias sociais. Em todo caso, esse fracasso relativo, se o imediatismo nos fai lê-lo assim, deverá retar-nos a avaliar e colocar novas orientaçons e tácticas para que dependa de nós, e nom de azares externos, a consecuçom dos nossos objectivos estratégicos. Podemos fazer que o urgente favoreça o necessário.